O Supremo Tribunal Federal julgou nesta
quarta-feira (29/2) ser inconstitucional o caráter obrigatório do convênio
entre a Defensoria Pública de SP e a Subseção da OAB no Estado.
O julgamento decorre da ação direta de inconstitucionalidade nº 4.163, proposta
em 2008 pelo então Procurador-Geral da República, Antonio Fernando Barros e
Silva de Souza.
A ação atacava os artigos 109 da Constituição do Estado de São Paulo e 234 da
Lei Complementar Estadual nº 988, que prevêem a obrigatoriedade de realização
de convênio entre a Defensoria e a OAB/SP para que Advogados privados forneçam
serviço de assistência judiciária gratuita em caráter suplementar, mediante
remuneração com recursos públicos.
“A decisão não coloca em risco a continuidade do serviço de assistência
jurídica gratuita no Estado. O STF reconheceu que a Defensoria pode formular
convênios também com faculdades de direito e outras entidades, rechaçando a
ideia de que a OAB possui direito a um monopólio nos locais onde não
conseguimos atuar”, diz Davi Eduardo Depiné Filho, 1º Subdefensor
Público-Geral. “De qualquer modo, o trabalho realizado pelos Advogados
conveniados tem sido importante para a universalização desse serviço e a
Defensoria pretende manter o convênio em vigor, em comum acordo com OAB/SP”.
A Defensoria paulista defendeu ser infundado o entendimento de que a OAB-SP
possui direito a um monopólio na elaboração de convênio com a instituição. Para
a instituição, a autonomia administrativa garantida pela Constituição à
Defensoria Pública confere-lhe a prerrogativa de celebrar convênios com outras
entidades, com o objetivo de otimizar a gestão dos recursos públicos e buscar o
fornecimento de um serviço público mais eficiente, sempre observando os
princípios que regem a administração pública – como moralidade, legalidade,
economicidade, entre outros.
A decisão foi unânime - apenas o Ministro Marco Aurélio de Mello consignou voto
em separado, pois entende que, de acordo com a Constituição Federal, as
Defensorias Públicas devem ser plenamente estruturadas e que, por isso,
qualquer delegação de suas atribuições é indevida. Os demais magistrados
seguiram o entendimento de que a Defensoria possui liberdade para formular
convênios com a OAB e outras entidades, prerrogativa que não pode ser
transferida a outros órgãos. O relator do processo foi o Ministro Presidente
Cézar Peluso.
A ação
Para a Procuradoria Geral da República, as normas jurídicas estaduais deveriam
ser declaradas inconstitucionais em face do art. 134 da Constituição Federal,
que dispõe: “A Defensoria Pública é instituição essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa em
todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”. A ação ressalta
que a Defensoria possui autonomia funcional e administrativa e, por isso, não
pode ser submetida “às pressões da entidade (OAB) alheia à sua organização”.
Segundo a inicial, “a Defensoria Pública se vê compelida a atender, por
determinação da Constituição Estadual, intermediada por normas ordinárias
regulamentares, os propósitos financeiros impostos por entidade externa à sua
estrutura, comprometendo assim a sua autonomia funcional e administrativa.
Diminuindo seu papel essencial à função jurisdicional do Estado, a instituição
tem sua gestão retraída para que a Ordem assuma, não só sob o monte financeiro,
mas gerencial mesmo, a política de defesa dos interesses jurídicos dos
necessitados”.
A ação dizia ainda que “a Ordem toma para si a designação dos profissionais que
deverão atender o público, como ainda está obrigada a realizar rodízio – dando
chance a que mais advogados se valham dessa composição-, numa nítida confissão
do interesse corporativo que se desenha nesse cenário”. A ação foi defendida em
plenário pela Vice-Procuradora Geral da República, Deborah Duprat.
A Defensoria Pública de SP e a Associação Nacional de Defensores Públicos
(Anadep) atuaram no processo a título de amicus curieae – entidades
admitidas a se manifestarem, diante do interesse institucional em seu resultado
– e reforçaram os argumentos pela procedência da ação.
A Defensora Pública Daniela Sollberger Cembranelli realizou sustentação oral
representando a instituição. "O convenio foi celebrado há mais de 20 anos,
em tempo de silêncio constitucional sobre a Defensoria Pública, criada apenas
em 2006". Ela disse que o modelo atuou engessa a gestão da Defensoria
Pública e impede seu crescimento. "Sua perpetuação não pode ser chancelada
pelo STF".
Ela ressaltou também que a Defensoria promove uma assistência jurídica global e
diferenciada ao modelo de convênio, pois os Defensores atuam na área
extra-judicial e de educação de direitos, além de contar com quadro de apoio
multidisciplinar, conforme previsão de sua Lei Orgânica.
O Advogado constitucionalista Luís Roberto Barroso representou a Anadep. Para
ele, "a questão trazida para julgamento é extremamente simples. Quem dera
a vida fosse tão simples assim - diz respeito ao próprio conceito de convênio.
Espero ser capaz de demonstrar que não existe lógica jurídica possível a
sustentar a idéia de um convênio obrigatório. Além disso, trata-se de uma
realidade que não se conforma com o desenho constitucional do modelo de
Defensoria Pública autônoma".
Saiba mais
A Constituição Federal prevê que o atendimento jurídico à população carente
deve ser feito pela Defensoria Pública, uma instituição autônoma e formada por
membros com dedicação exclusiva, selecionados após rigoroso concurso público.
Em SP, a Defensoria foi criada no ano de 2006. Atualmente, conta com um quadro
de 500 Defensores Públicos e atua em 29 cidades no Estado.
Como o quadro não é suficiente para atender toda a demanda, Advogados privados
interessados são credenciados para a realização desse serviço. Atuam, em
caráter suplementar, nas cidades onde a Defensoria não possui unidades
próprias, sendo remunerados com recursos da própria Defensoria.
Fonte:
http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=38619&idPagina=1&flaDestaque=V